EVOLUÇÃO ECONÔMICA DE MOSSORÓ

domingo, 3 de maio de 2009

Carlos Escóssia

Para abordar o aspecto econômico de Mossoró, necessário se faz contextualizar a sua economia a níveis nacional e regional. Como país, sempre fomos visto como empresa comercial que, desde o período da colonização, acenava para quem descobrisse com sinais de exploração e lucro. Conquanto existam teorias que defendam a existência dos modos de produção escravista ou feudal, durante os períodos colonial e imperial que tivemos, temos a compreensão de que sempre constituímos um país capitalista.

No caso especifico do Brasil, a evolução do capitalismo obedeceu algumas fases, que podem ser assim expressas (01): O Capitalismo Mercantil, que compreendeu o período colonial (até 1808) e o modelos primário exportador de desenvolvimento sob o domínio da capital industrial central, de 1808 a 1930; e o Capitalismo Industrial, que congrega o modelo de industrialização substituto de importações (de 1930 a 1954) e o modelo de subdesenvolvimento industrializado, com inicio em 1954 e consolidada a partir de 1964 com o Estado tecnoburocrático capitalista.

Daí se pode concluir que a economia brasileira, além de capitalista monopolista, é também tecnoburocrático estatal, ou seja, vivemos sob o capitalismo monopolista estatal. Convém ressaltar que o modelo de subdesenvolvimento industrial, caracteriza-se pela existência de dois setores: um monopolista e estatal, onde as grandes empresas e o estado detém a tecnologia moderna e sofisticada; e um setor competitivo que abriga as pequenas e médias empresas, os setores da economia de auto-consumo e as populações marginais urbanas. O sistema de trocas que ocorre entre os dois setores, tende a ser tão desigual quanto aquelas existente entre países industrializados e primário-exportadores, a nível internacional.

Se estendermos a abordagem para o contexto regional, é possível observar que na atual fase do capitalismo brasileiro, as regiões de maior concentração capitalista (ditas “metrópoles”), transferem para aquelas de menor concentração (conhecidas como regiões “satélites”), toda a gama de problemas advindos da crescente marginalização dos migrantes. O nordeste brasileiro, que sofre essas conseqüências, cria em suas cidades indústrias poupadoras de força de trabalho, que restringem o mercado e provocam um falso desenvolvimento, contribuindo para uma inchação e conseqüente descapitalização da economia regional.

Em se tratando de Mossoró, constata-se que sua economia sofre manipulação sob duas perspectivas: a da classe dominante, no município, e a de interesses extra-municipais, ou seja, regionais. Saliente-se que esses interesses são ditados pela expansão natural do capitalismo, que aqui se redefiniu por algumas áreas em detrimento de outras (setor monopolista e competitivo). (02) Com o propósito de melhor compreender a economia local, optamos por dividi-la em três momentos: Empório Comercial, Agro-Industrial e Prestadora de Serviços, que serão aqui abordados.

O ano de 1857 teve o seu marco histórico com a Cia. Pernambucana de Navegação Costeira que deixou de fazer escala no Porto de Aracati, passando a fazê-la no Porto de Areia Branca. Esse fato originou a chegada de novos comerciantes e firmas à cidade dinamizando o comércio local. (03) Mossoró aparecia então, como lugar próximo dos centros produtores da economia do litoral e dos sertões e de fácil acesso ao centro escoador, a saber, o porto de Areia Branca. Com a vinda de novas forças produtivas, Mossoró perde sua função de empório comercial. Perde pela saída de capitais e empresas, em virtude do retardamento da chegada da estrada de ferro e do aparecimento dos transportes rodoviários, que desbarataram o método antiquado de fazer comércio. (04)

A acumulação de capital por parte dos comerciantes de Mossoró, é suficiente para envolver a cidade em uma outra economia. Com a chegada de fábricas de beneficiamento de algodão, óleo de oiticica, cera de carnaúba, sal, etc., ocorre à mudança de empório comercial para agro-indústria. A especialização industrial de Mossoró permite identificar duas fases marcantes: primeira, que vai de 1920 a 1954, quando a cidade ganha cerca de 30 unidades industriais; segunda, 1955 a 1968, quando são instaladas 132 unidades produtivas, nos mais diversos ramos. (05)

É interessante ressaltar que tanto na fase do empório comercial, quanto na fase agro-industrial, a presença do poder público municipal é marcante na preparação da infra-estrutura indispensável para viabilizar essas economias. Com a falência da agro-indústria, percebemos a ausência do poder municipal para criar as condições necessárias que viabilizem a implantação de um novo momento da economia local.

Em Mossoró, a urbanização e as migrações campo-cidade se processaram a revelia da modernização da cidade e nas poucas indústrias criadas nos últimos 15 anos (para substituir o mercado de trabalho com a falência das agroindustriais e com a mecanização das salinas), verificamos a capacidade de suscitar euforia com relação ao emprego urbano-industrial. Por isso, as população advindas de áreas rurais de cidades vizinhas, estão se deslocando para Mossoró que, enquanto centro regional, pode lhes oferecer um bom emprego.

Diante deste quadro, reside a dúvida: será que a industrialização seria a solução ou o problema reside no campo, onde a concentração de terras nas mãos de poucos proprietários (criando condições de trabalhos desumanas) e as secas fustigantes na região, agudizam a situação de crise permanente do trabalhador rural, que não tem outra saída a não ser migrar para a cidade, sendo esse talvez, o seu único direito. (06) Podemos, ainda, indagar: qual o sustentáculo econômico de Mossoró? Respondendo, sem medo de errar, é o setor terciário, a base de nossa economia.

Em meados de 1965, com a falência da agroindústria e a mecanização das salinas, Mossoró preocupa-se em reorganizar sua economia e o faz através da implementação do setor terciário. O setor que, segundo Chico de Oliveira (07) “engloba as atividades que estão nas esferas da circulação, da distribuição e do consumo”, “não só das mercadorias, mas também do próprio capital” como completa José Lacerda Alves Felipe, em seu livro ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO URBANO DE MOSSORÓ. Nessa mesma obra, Lacerda enfatiza a importância do terciário para cidades que, como Mossoró, se constituem “centros regionais”, aglomerando prestações de serviços às cidades circunvizinhas.

Saliente-se que as instituições prestadoras de serviços (universidades escolas, bancos, previdência social, assistência médico-hospitalar, entre outros) geram uma massa salarial que culmina em formar uma sucessão continua e ininterrupta de demandas, ou seja, o aumento de instituições que possibilitam maior número de salários propiciam o incremento das atividades comerciais locais que por sua vez, requer pluralidade dos serviços oferecidos e faz surgir, através da acumulação de capitais, novas indústrias na região. Por outro lado, a terceirização da economia viabiliza a migração campo-cidade, pela euforia que a oferta de empregos e serviços viabiliza, trazendo conseqüências negativas para a cidade, tais como: desemprego, favelização e marginalização.

Em Mossoró, a expansão do terciário foi inicialmente viabilizada através da prestação dos serviços básicos - educação e saúde – e o incremento do comércio local. Na área de educação, teve importância impar a oferta de cursos superiores ofertados pelas Universidades do Estado do Rio Grande do Norte-UERN e Universidade Federal Rural do Semi Árido-UFERSA, que favoreceu 1° e 2° gruas, com maior número de Escolas implementadas pelos poderes públicos municipal e estaduais. Também na área de saúde, novos hospitais, ambulatórios e farmácias passaram a oferecer assistência médico-hospitalar à população mossoroense. Esses serviços, somados à maior dinamização do comércio da cidade, aliam-se às instituições prestadoras de serviços, dentre as quais podem ser citadas: a Fábrica de Cimento Nassau e a Petrobrás, com suas subsidiarias locais.

Para termos um exemplo concreto da hegemonia do setor terciário, basta sentir na nossa região, a ausência de grupos economicamente fortes. Se retrocedermos à década de 50, podemos notar a presença de grupos de força econômica e política na região, que hoje se encontram economicamente esfacelada, por não terem tido condições de acompanhar as necessidades de uma política econômica condizente com as reais necessidades da região, preferindo adapta-se às migalhas da prestação de serviços, uma vez que isso hes assegurava pelo menos, a hegemonia política da cidade.

Notamos, ou melhor, sentimos na própria carne, uma certa falência de Mossoró, que igual a outras cidades nordestinas vem dia-a-dia se descapitalizando através da entrada do capital financeiro. Isso permite que sejam abertas as portas ao capital estrangeiro, com o intuito de enfraquecer a economia regional, tirando da classe dominante local o controle econômico e em contrapartida, fazendo reproduzir o capital aqui aplicado, em detrimento da classe antes monopolista.

Em Mossoró, é possível constatar a influência do capital financeiro, frente ao esfacelamento e à falência da sua própria economia. A cidade hoje, possui inúmeras agências bancarias (08) abrindo as portas para a penetração do capital nacional e internacional, antes centralizado nas regiões metrópoles. Com a chegada destes bancos, foram engendradas novas e eficientes formas de drenar os recursos regionais, para a região sudeste, permitindo que lá ocorra a concentração capitalista brasileira, sem mais fazer uso do centro regional. Ao se instalar, o banco possibilita novas formas de reprodução do capital e em um curto espaço de tempo, envolve a economia local no grande mercado nacional e internacional, sucessivamente.

Destruindo a economia local o banco atua como “ponta-de-lança” para a penetração do grande capital da região sudeste e/ ou das multinacionais. Neste caso, a cidade reduz sua função de centro de repasse do capital regional. O banco, ao instalar-se numa cidade, cria seu capital através dos depósitos e poupanças locais. De posse desse capital tem inicio o financiamento de atividades comerciais, indústrias de transformação e algumas atividades agrícolas, particularmente aquelas ligadas aos produtos de exportação.

O banco tem o poder de transformar mercearias e/ou bodegas de cidade pequenas, em “supermercados” que em pouco tempo eliminam as outras mercearias, na medida em que tira das prateleiras o produto regional, substituindo-o por produtos da região sul/sudeste Em outros casos, os bancos repassam esses capitais para as grandes cidades, onde os lucros são maiores. Desta forma, os bancos atuam também como instrumento dos desequilíbrios regionais, no momento em que drenam o capital local para fora da região, deixando à mesma descapitalizada e aumentando ainda mais a dependência de toda a economia local e regional ao capital financeiro.

Um fato novo que vem propiciando ainda mais o “inchamento” de Mossoró é esta megalomania de se vender à falsa imagem de uma cidade próspera, que cresce em ritmo acelerado e se constitui geradora de emprego. Consideramos esse fenômeno, fruto de uma profunda irresponsabilidade da nossa classe política, que só tem defendido interesses próprios e reforçado cada vez mais, o descompromisso que detém para com a região. Basta de discursos demagógicos. O que se faz urgente é que essa classe política, única responsável por esta situação, ultrapasse os limites das brigas domésticas e procure resgatar suas dividas junto à comunidade local.
Bibliografia Citada:
(01) – Luís Carlos Bresser Pereira, Economia Brasileira – uma introdução crítica, p. 12-13.
(02) – José Lacerda Alves Felipe, O Urbano no Rio Grande do Norte (notas para estudo), p.26.
(03) – José Lacerda Alves Felipe, Mossoró – um espaço em questão, p. 08.
(04) – José Lacerda Alves Felipe, O Urbano no Rio Grande do Norte (notas para estudo), p. 49-53.
(05) – José Lacerda Alves Felipe, Organização do espaço urbano de Mossoró, p. 67.
(06) – José Lacerda Alves Felipe, O Urbano no Rio Grande do Norte (notas para estudo), p. 26.
(07) – Francisco de Oliveira, Elegia para uma Re(li)gião, p. 147.
(08) – PETROBRÁS, Levantamento sócio-econômico cultural da cidade de Mossoró, p. 20.

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